quinta-feira, 12 de maio de 2016

Brasília / DF: Senado aprova abertura de processo de impeachment contra Dilma

Crise política12/05/2016 | 06h35Atualizada em 12/05/2016 | 08h59

Por 55 votos a 22, senadores decidem pela continuidade  do rito pelo afastamento da presidente

Senado aprova abertura de processo de impeachment contra Dilma Diego Vara/Agencia RBS
Foto: Diego Vara / Agencia RBS
Depois de mais de 20 horas de sessão, às 6h38min desta quinta-feira, o Senado selou o destino da primeira mulher eleita presidente da Brasil: por 55 votos a 22, aprovou a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff. Com o resultado, a petista que recebeu 54 milhões de votos em 2014 será afastada do cargo por 180 dias, até o julgamento final, e corre o risco de não voltar mais ao Palácio do Planalto.
O clima, dessa vez, foi diferente daquele que marcou a votação na Câmara dos Deputados, em abril. Os discursos assumiram tom mais formal — alguns inclusive foram lidos na tribuna. Não houve bate-boca nem grandes arroubos, e o plenário chegou a ficar quase vazio em alguns momentos. O voto eletrônico, registrado no painel, impediu as dedicatórias constrangedoras. Ficou a sensação de que os senadores se limitaram a cumprir a formalidade, já que o resultado era esperado por todos, inclusive pelos governistas.
Assim que o debate começou, às 10h de quarta-feira, com 60 minutos de atraso, os apoiadores de Dilma levantaram questões de ordem e foram criticados por atrasar os trabalhos. Lindbergh Farias (PT-RJ) e Paulo Rocha (PT-PA) negaram se tratar de manobra — mas, nos bastidores, o PT teria a intenção de empurrar a posse do vice-presidente, Michel Temer, para a sexta-feira, 13, pelo simbolismo da data. Ganharam mais uma hora de fôlego.
Somente por volta das 11h20min, a senadora Ana Amélia Lemos (PP) — primeira da lista de 71 oradores inscritos para fundamentar o voto 1 foi chamada a se manifestar. Defensora do avanço do debate, ela destacou o impacto das pedaladas fiscais na vida dos brasileiros e justificou a escolha:
— A lei é para todos. E temos a obrigação e o dever de respeitar a lei. É exatamente por isso que encaminho o meu voto favorável ao impedimento e à admissibilidade do processo.
Na sequência, José Medeiros (PSD-MT) criticou a gestão petista e a reação ao impeachment.
— Onde já se viu golpe em um país de imprensa livre? Como falar em golpe em um quadro de normalidade institucional? Esse discurso apenas demonstra novo episódio de irresponsabilidade institucional do governo — atacou.
As críticas prosseguiram com Marta Suplicy (PMDB-SP), Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Zeze Perrella (PTB-MG), diante de cadeiras desocupadas e algum burburinho nas galerias.
— Estamos escolhendo a esperança, e não o caos sem amanhã. As pessoas querem sentir que existe um governo. Esse é um momento de recuperação — enfatizou Marta, ex-petista.
O primeiro a defender Dilma foi Telmário Mota (PDT-RR). Décimo segundo a falar, ele destacou a honestidade da presidente:
— Dizer que ela cometeu qualquer ato de má fé é no mínimo estar escondendo a verdade. Esse impeachment nasceu do revanchismo e do ódio.
Mais tarde, Vanessa Grazziotin (PC do B-AM) também faria intervenção forte de apoio a Dilma.
— Impeachment é um pretexto para que se restabeleçam as políticas de apartheid social tão bem descritas no Ponte para o Futuro (programa de governo do PMDB). Muitos acreditam que o sabor da aprovação popular momentânea pode suplantar o império da lei — afirmou.
Às 16h50min, apenas 16 inscritos haviam se pronunciado. A oposição tentou convencer o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), a reduzir o tempo dos discursos para acelerar os trâmites, mas os governistas discordaram.  
— Não podemos mudar a regra no meio do jogo — advertiu Humberto Costa (PT-PE).
Sem disposição para comprar a briga, Calheiros decidiu que o tempo de cada pronunciamento continuaria em 15 minutos.
— Não quero ter a responsabilidade de atrasar ou adiantar o relógio da história — justificou.
A partir daí, após intervalo, a sessão prosseguiu noite adentro. Incomodado com as conversas paralelas, Calheiros chegou a ameaçar suspender os trabalhos se os colegas não parassem de conversar e não guardassem os telefones celulares.
Lasier Martins (PDT) expôs seus argumentos por volta das 21h. Citou a Operação Lava-Jato, disse duvidar de que a presidente não sabia dos desvios na Petrobras e evocou a Lei de Responsabilidade Fiscal para apontar equívocos do PT.
— Isso já foi exaustivamente comentado e dissecado e contextualizado. Para quem votará pelo afastamento, convém repetir que houve crime de responsabilidade — destacou.
Uma das manifestações mais esperadas foi do ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTC-AL), às 23h10min, que mereceu raros minutos de atenção e silêncio. Collor recordou a própria experiência, em 1992, e fez um desabafo, reclamando da diferença de tratamento em comparação com Dilma.
— O rito é o mesmo, mas o ritmo e o rigor, não. Em 1992, fui instado a renunciar na suposição de que as acusações contra mim fossem verdadeiras. Dois anos depois, fui absolvido no Supremo Tribunal Federal. Portanto, dito pela mais alta corte do país, não houve crime. Mesmo assim, perdi meu mandato e não houve qualquer tipo de reparação — disse.
O ex-presidente criticou o governo petista e revelou ter alertado Dilma sobre o impeachment, mas não deixou claro como votaria.  
— Alertei sobre a possibilidade de impeachment, mas não me escutaram. Ouvidos de mercador — ironizou.
Collor classificou como crime de responsabilidade "a mera irresponsabilidade com o país, seja por incompetência, irresponsabilidade ou má fé". Concluiu afirmando que a história havia lhe reservado esse novo momento.
Às 2h50min, foi a vez do senador Paulo Paim (PT) justificar o voto contra o impeachment. O gaúcho classificou o atual momento da vida nacional como "vergonhoso" e criticou o vice-presidente Michel Temer (PMDB).
— É legítimo que qualquer brasileiro queira chegar à Presidência, mas não o faça dessa forma — apelou, sugerindo que o vice entra "pela porta dos fundos".
Os discursos se seguiram, um após o outro, sem contendas. Nos bastidores, alguns jornalistas chegaram a dormir. Quando José Serra (PSDB-SP)falou, por volta das 4h, o movimento recomeçou.
As atenções se voltaram então para um dos escudeiros de Temer, o senadorRomero Jucá (PMDB-RR). Ele deve integrar o núcleo duro do novo governo e agiu como um advogado do vice-presidente:
— O PMDB apoiou a chapa (com o PT à Presidência), é verdade. E indicou o vice Michel Temer, homem honrado, que merecia os melhores elogios do PT. O PMDB, que foi o partido que elegeu o maior número de governadores, deputados, senadores, ajudou a dar a vitória. Agora o vice, pela legitimidade dos votos e da Constituição, é quem assume, se o Senado tomar a decisão, representando o povo e a sociedade.
Pouco antes das 6h, o relator do processo, Antonio Anastasia (PSDB-MG), e o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, responsável pela defesa, tiveram 15 minutos cada para falar. Anastasia citou decisão do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, que negou, no dia 11, a tentativa de Cardozo de anular o processo, como prova da consistência das acusações.
— Teori foi extremamente claro, didático, pedagógico — ressaltou.
Cardozo se exaltou ao defender Dilma. Voltou a dizer que "não existem crimes de responsabilidade caracterizados" e que "os fatos foram encaixados" para "justificar" o afastamento. Citou o "agir degenardo" do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no processo.
—O Brasil sabe disso. O mundo sabe — bradou Cardozo. 

— Se está cometendo uma justiça histórica. Se está condenando uma inocente.
Aos poucos, o plenário encheu. Nas galerias, o ato seguinte foi acompanhado de pé. A votação ocorreu após discurso de Calheiros, quando o sol já raiava, e durou menos de cinco minutos. Estampado no painel, o resultado foi comemorado por senadores da oposição e soou como um golpe para os petistas, que esperavam a derrota, mas por um placar menor. Os 55 votos pelo afastamento representam um voto além do necessário para a cassação, no julgamento final. 

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